biografia
Andre Guacurary y Artigas (Andresito)
Autor(es): Karina Mello
Biografado: Andre Guacurary y Artigas (Andresito)
Povo indígena: Guarani
Estado: Rio Grande do Sul
Categorias:Biografia, Etnias, Guarani, Estado, Rio Grande do Sul
Tags:Guarani, Masculino, Rio Grande do Sul
Quando os índios assumem o poder: histórias vividas por Andrés Guacurary y Artigas e “os seus”
O lugar dos índios na história
O período mais conhecido da vida de André Guacurary y Artigas se deu entre os anos de 1815 e 1821, quando ele teria por volta de trinta anos de idade. Não se sabe ao certo onde e quando nasceu Andresito (como o indígena guarani-missioneiro era chamado). Foi num lugar próximo às margens do rio Uruguai. Há dúvida se do lado oriental do rio, no povo de São Borja, ou do lado ocidental, no povo de Santo Tomé[1]. Também não se sabe se faleceu a bordo de um navio na costa brasileira ou em terra firme, no Rio de Janeiro. Provavelmente, André morreu longe de sua terra natal, na qual tantos conflitos e alianças foram estabelecidos, tantas batalhas foram travadas, tantos cenários modificados com a participação marcante dos indígenas na região platina. Este era o lugar para onde tentava voltar quando desapareceu dos registros, logo depois de ser preso por forças portuguesas e levado para a capital do Rio de Janeiro. Um dos últimos documentos escritos por ele foi uma solicitação encaminhada ao rei de Portugal, na qual pedia ‘algum auxílio’ para voltar para casa. Após um ano e quatro meses de prisão, ele foi “posto em minha natural liberdade”, como enfatizou. Contudo, em sua opinião, como “resultado de um padecimento tão desumano”, seu estado era precário. Até mesmo as roupas que vestia não eram suas. Era preciso, concluiu o indígena, voltar “ao meu país natal, e recolher-me ao abrigo dos meus, (…) cobrir minha nudez, e empreender a dita viagem”[2]. Isto é, a identidade, o território e as histórias indígenas recuperam laços inextirpáveis trazidos através de atuação, das palavras e da trajetória de André e dos seus, pois entrelaça importantes mudanças políticas em curso naquele contexto às ações de coletividades indígenas. É preciso refazer e repensar os caminhos trilhados pelos indígenas ao longo de suas histórias, para entender os significados dos deslocamentos espaciais e sociais vividos por eles bem como seus esforços constantes para reaver territórios e direitos e lograr participação política.
Os atos indígenas, como nos mostram diferentes etapas da vida de André, jamais se afastaram da história das revoluções na região platina, afinal, sem dúvida, nascer à beira daquelas águas da bacia do Prata e, provavelmente, morrer em algum lugar da costa carioca, guarda uma estreita relação com o processo de formação dos Estados nacionais na região platina. Andresito veio ao mundo em princípios do último quarto do século XVIII, mesma época em que Buenos Aires se tornou a capital do recém-fundado vice-reino do Prata e as reformas bourbônicas foram postas em prática em terras missioneiras. Muito jovem, certamente partilhou dos efeitos da conquista de sete dos trinta Povos para a Coroa Portuguesa. André circulava pela região da campanha e experimentou, também, o recrutamento de soldados indígenas, através do qual, é possível que tenha conhecido José Artigas. Curiosamente, ou nem tanto assim, a parte mais transparente da vida de André é a conturbada década de 1810, em que desempenhou um papel de relevo nos conflitos posteriores à revolução de Maio daquele ano, evento que inaugurou um longo e agitado processo no vice-reino do Prata em busca de autonomia em relação à coroa da Espanha.
Se a definição precisa dos lugares de seu nascimento e morte é duvidosa, é possível conhecer em boa medida e com alguma riqueza de detalhes os lugares políticos e sociais que ocupou durante a década de 1810. Sabe-se que participou como líder político e militar de pelo menos quatro campanhas importantes. A primeira, contra o Paraguai em 1815, quando assumiu o cargo de governador e comandante geral de Misiones, um feito político inédito por aquelas bandas. Misiones era uma das províncias platinas mais disputadas entre portugueses, espanhóis, portenhos e habitantes locais; uma grande porção de terra cujo histórico de ocupação é capaz de contar muito sobre a experiência de André e seus antepassados[3]. A segunda campanha foi em 1816, contra os portugueses que buscavam ocupar as missões ocidentais, (à ocidente do rio Uruguai). Na terceira campanha, Andrés e ‘seu exército de índios’, como se disse à época, invadiu a capital da província de Corrientes em 1818, tendo como um dos objetivos imediatos restituir o cargo de governador a Mendes, que havia sido deposto por forças bonaerenses. Na quarta, em 1819, novamente enfrentou forças portuguesas durante as reiteradas incursões aos povos orientais. Nesta derradeira campanha, foi capturado e levado preso ao Rio de Janeiro, onde possivelmente faleceu, entre 1821 e 1822, quando o Império do Brasil declarou, neste último ano, sua independência de Portugal. Ou seja, histórias sobre as terras que dividiram e interligaram espaços disputados estão profundamente conectadas às experiências indígenas. Apesar disso, tais histórias continuam a ser subexploradas, dificultando o acesso a outras perspectivas e olhares sobre as motivações e as maneiras próprias de exercer autonomia política num contexto conturbado.
Desprezo e terror, ira e (in)tolerância: crenças sobre vingança e justiça na invasão de Corrientes
Era o começo de uma tarde de sexta-feira quando moradores da capital da Província de Corrientes presenciaram um acontecimento histórico que despertou os mais variados e controversos sentimentos. No dia 21 de agosto de 1818, as tropas indígenas de André Guacurary e Artigas entraram na cidade “como em triunfo, entre música, salvas e repiques gerais”. Foram recebidos na igreja matriz pelo clero e por toda comunidade religiosa, autoridades políticas e outras figuras ilustres do vecindario, “com toda a etiqueta do cerimonial”, de acordo com uma testemunha ocular dos fatos, o comerciante espanhol Fermín Félix Pampín[4].
Desde maio de 1818, Corrientes vivia dias de esperança para alguns, incertezas e temores para outros, como deixam claro “as infelizes memórias” escritas pelo comerciante espanhol, e os “Extractos de mis recuerdos sobre Corrientes”[5] elaborado pelas filhas de um comerciante inglês, as irmãs Postlethwaite. O governo de Corrientes fazia parte do sistema da Liga dos Povos Livres, através do apoio prestado pelo governador da Província, Juan Bautista Méndez, a José Artigas. André, desde os combates travados com exércitos do governo paraguaio e português, solicitava continuamente reforços de Corrientes. Naqueles dias, Méndez atendeu a um desses pedidos enviando José Francisco Vedoya e suas milícias com ordem de se unirem às de André. Mas Vedoya, influenciado por enviados do governo de Buenos Aires que buscavam cooptar o apoio dos correntinos e “zeloso de uma honra que não lhe acompanhava, atribuiu aquém de sua pessoa sujeitar-se às ordens de um chefe índio, e sem manifestar o agravo ao seu governador, se evadiu das ordens”[6].
Como não é difícil de imaginar, estes acontecimentos provocaram dissidências entre autoridades locais e, mais uma vez, dividiram opiniões entre a anuência e o rechaço à causa artiguista. Depois de alguns conchavos e debandadas, Méndez foi destituído do cargo de governador por José Francisco Vedoya e seus apoiadores, entre eles, Elías Galván, que fora governador de Entre-Rios. No dia 25 de maio de 1818, Vedoya reuniu o cabildo e tomou o poder. Após reordenar as ações das milícias no campo, nas proximidades de onde se achava André, regressou e efetuou sua entrada na cidade com desfiles de piquetes, peças de artilharia, equipamentos e munições, além de uma tropa de cerca de quinhentas pessoas. Escoltou Mendéz à sua residência e lá o deixou preso.
Mesmo animados com as notícias que corriam sobre o enfraquecimento dos recursos de José Artigas, o cabildo da cidade e o novo governador, apoiados por Buenos Aires, não deixaram de temer que seus contrários buscassem pelo apoio de André. Justo o que sucedeu. Sob o “falso suposto de fidelidade às bandeiras Orientais” ou “envelhecidos ressentimentos contra a família do novo coronel”[7], comandantes militares de localidades próximas, como Curuzú-Cuatiá e San Roque, Yaguareté e Goya reuniram as gentes dos seus partidos a fim de repor Méndez no cargo. A eles se uniu um ‘inglês curtidor’ de couro de nome Pedro Campbell, que também daria o que falar.
Um dos membros da família arqui-inimiga dos Vedoya, Miguel Escobar, “fazia publicar que esperava em seu auxílio o comandante André Artigas, com seus guaranis pelo lado das Misiones”[8].Vedoya dizia acreditar que “o chefe das Misiones, com seus índios, haviam sido completamente derrotados pelos portugueses”. Apesar disso, de acordo com o detalhado relato de Pampín, “esta notícia cobriu de pânico e terror ao chefe Vedoya e seu conselho”. Não demorou muito para que Vedoya agisse como era de costume na região, conforme vimos nos sete capítulos anteriores: buscou apoio militar na campanha através do recrutamento das gentes dos arredores, afinal, “não duvidava do auxílio dos guaranis, ainda que supusesse olhá-los com desprezo”[9].
Enquanto buscava aliados, soube que os indígenas do Povo de Garças reuniam cavalos para auxiliar as tropas de San Roque, que atuariam a favor de André Artigas e Miguel Escobar. Ordenou, então, um massacre ao lugarejo dos índios, seguido da previsível tomada de seus animais e bens. Segundo Pampín, de cerca de sessenta pessoas – trinta famílias, conforme o relato das Postlethwaite –, apenas três crianças pequenas sobreviveram ao ataque. Elas foram levadas como “troféus” de guerra quando “tomados os cavalos que tinham os índios e roubados até os mais miseráveis dos móveis, regressaram os vencedores de Garças ao seu quartel general de Saladas, levando como em triunfo, os três miseráveis neófitos que havia perdoado a ferocidade de seus calibres”[10]. Nas palavras encabuladas de Pampín, as tropas de Vedoya não respeitaram anciãos, crianças de colo, nem “o débil sexo” que haviam se refugiado na igreja: “tudo registram para encontrar um índio mais para assassinar, cristaleiras de santo óleo, causas consagradas, efígies de santos (…)”[11].
Apenas “a imaginação da pintura dessa carnificina, que nunca se apresentará à memória”, dizia Pampín, não podia ser evocada sem abalar os pressupostos daquilo que nos torna humanos. No relato das irmãs Postlethwaite, entre os sobreviventes estava também uma mulher indígena. Depois de presenciar os filhos e o marido serem assassinados, conseguiu fugir; “foi trazida a Corrientes com uma ou duas feridas de bala e várias feridas de sabre”[12]. Foi então que o comerciante inglês, pai das Postlethwaite, escreveu uma carta a André, na qual lhe perguntava se sua família e seus bens estariam seguros em Corrientes, depois que “Vedoya havia feito assassinar cruelmente a todos os habitantes de uma aldeia indígena, poucas semanas antes, porque se negaram a tomar as armas contra Artigas”[13]. André respondeu sem demora, de maneira muito cortês, segundo as jovens inglesas. Assegurou que não havia motivo para alarme e para sair da cidade e pediu para que, dentro em breve, pudesse cumprimentar a toda família Postlethwaite. Anunciava assim, numa correspondência particular, a procedência dos rumores sobre sua chegada a Corrientes.
Depois do massacre em Garças, Vedoya obteve notícias de que André, de fato, se aproximava da capital. Mandou-lhe ofícios questionando a vinda de suas tropas sem dar aviso ao governo de Corrientes. Evadindo-se de enviar uma informação exata, o comandante indígena respondeu de maneira “mais altiva” do que se esperava, no entender de Pampín, adiantando que daria o aviso em melhor ocasião para satisfazer ao “nobre vecindario” correntino. Vedoya, então, deu “ordem de atacar até derrotar (…) e precipitar os índios no Uruguai”[14], ações que foram postas em prática. Porém, estes ataques arquitetados sem estratégia, unidos aos sentimentos de desprezo pelos índios, ponderou o comerciante espanhol, fez com que “para a surpresa de todos, (…) às duas da tarde do dia 2 de agosto, veem chegar à praça principal ao eleito governador, com uma curta escolta, derrotado, fugitivo e completamente assustado pelos mesmos índios depreciáveis que, poucos dias antes, assegurava ia concluí-los e acabá-los”[15].
Dali em diante, a cidade de Corrientes e seus habitantes viveram dias ainda mais agitados. Vedoya havia sido derrotado por um exército missioneiro logo depois de promover uma matança num povoado indígena. Para os correntinos, os acontecimentos pareciam indicar um presságio do que estava por vir. Consternados, em certa medida, com o que ocorrera em Garças, colocavam-se no lugar dos massacrados, e, desde sua posição de desvantagem, imaginavam que haveria vingança por parte dos indígenas. Corria rumores sobre a marcha do exército vencedor em direção a Corrientes, e que pelo caminho, os indígenas matavam e degolavam homens, mulheres e crianças sem clemência, tal como fizera Vedoya em Garças. Neste primeiro momento, foram atormentados pela possibilidade da ‘invasão’ da cidade pelos indígenas, através de notícias que chegavam a cada dia que se passava e “envolvidas nas cores mais tristes”[16].
Famílias arrumavam suas bagagens e preparavam-se para a fuga, figuras ilustres escondiam bens e enterravam dinheiro num corre-corre que parecia não ter fim. Conforme a descrição de Pampín, um “conjunto dos mal-estares e desgraças que cada qual fabricava em sua imaginação e que já pareciam estar sofrendo fisicamente, tinha a todos os habitantes da cidade em tal conflito e terror, que não é possível descrever, nem a pluma indicar”[17]. O próprio Vedoya, “mais embusteiro que um epitáfio”, ressentia-se Pampín, organizava a fuga de sua família a bordo de um navio. Os soldados responsáveis pela guarda da cidade se embriagavam e davam vazão aos seus temores em brigas, tiros e disparos de canhão, o que piorava o estado de ânimos dos moradores que pensavam, a todo momento, que os índios haviam chegado. Enquanto isso, cabildantes, deputados e outros políticos tentavam achar uma solução para o grave problema da acefalia no governo, já que Vedoya preparava-se para a fuga. Reunidos na sala do congresso, ficaram completamente transtornados ao saberem que os indígenas adentravam “aos subúrbios da cidade”. Embora este fosse mais um falso alarme, “já lhes parecia que os índios entravam a degolá-los na sala. Tudo eram lamentos e confusões e querendo todos sair, todos se atropelavam, (…) não se dava lugar para descer as escadas e houve alguns tão afobados, que faltou pouco para se atirarem pelas varandas”[18]. A noite foi de terrível espanto e terror, assegurou Pampín. Não obstante, no dia seguinte, os deputados enviaram uma comissão para tratar com André. O objetivo era fazer:
(…) ver o vencedor, os autores e os não culpados na última revolução, suplicando-lhe não quisesse descarregar sua ira contra os inocentes, já que os primeiros haviam fugido da Província. Estas súplicas não mereceram do chefe índio outra contestação que a de que ‘JÁ É TARDE A DEPUTAÇÃO DO GOVERNO DE CORRIENTES’[19].
A resposta de André, descrita em letras garrafais por Pampín, “afligiu mais e mais os habitantes da cidade, tanto que acreditavam se acharem nos últimos períodos de sua vida, pois (…) diziam alguns que os índios vinham a passar em degola todos os seus habitantes”. No entanto, deixando de lado os dizeres sobre o “que cada qual fabricava em sua imaginação”, uma das primeiras medidas concretas que André tomou foi ordenar o recolhimento de todas as armas através de um bando público que a cidade de Corrientes fez circular pela província homônima. Poucos dias depois, enviou à cidade seu encarregado da Marinha, o inglês Pedro Campbell, a fim de providenciar os preparativos para sua chegada. Campbell era uma figura que chamava atenção, tanto pelo alcance de sua rede de relações quanto pela sua origem[20] e o modo como se portava. Comerciante de couros, ele teria oferecido seus serviços a André logo depois da derrota de Vedoya. O homem alto, ‘ossudo’, de cabelo e barba louros, pele do rosto descascada pela exposição ao sol, “aderido pelo suor e coberto de pó”, andava “vestido de gaucho” e armado dos pés à cintura. Trazia faca nas botas de potro, um sabre na bainha de metal e pistolas no cinturão de couro. O poncho esfarrapado e um chapéu “dos que usam os salteadores”, como nos deixa saber a rica descrição de Pampín, o fez concluir que o inglês e Eduardo, o cavaleiro oriundo de Tipperary que sempre o acompanhava, não passavam de “dois dos ferozes bandidos de Artigas”[21].
Campbell chegou a Corrientes em companhia de cerca de cem indígenas. Deu a volta na praça e instalou a tropa na casa de uma das ricas famílias que, como a de Vedoya, havia deixado a cidade. O inglês ‘gaucho’ mandou informar ao Sr. Postlethwaite que André veria com agrado a presença daquela família no cerimonial de entrada dos indígenas na cidade[22]. As notícias sobre a chegada do exército missioneiro à capital já não eram mais infundadas. Foram meticulosamente divulgadas por Campbell e pelos indígenas, apesar de que os correntinos “com os mesmos anúncios se faziam beber o cálice de sua ruína, desejavam com ânsia que saíssem de uma vez da lamentável consternação em que jaziam”[23]. Cinco dias depois, viram com seus próprios olhos “ao índio comandante general das Misiones, Dom André Artigas”[24]. Na tarde de 21 de agosto de 1818, o líder indígena chegou a Corrientes, acompanhado de um piquete e de um esquadrão de cavalaria, um batalhão de infantaria e cerca de duzentos meninos indígenas que, armados como os demais soldados, fechavam a retaguarda das tropas[25]. Também trouxe consigo dois canhões dos que Vedoya havia perdido em combate. À distância de uma légua da cidade, André marchou a pé e desarmado.
Entrou na cidade ao som de hinos religiosos, descansou numa capela e ouviu missa na igreja matriz. Além do clero, foi recebido e acompanhado por Méndez, o governador deposto, e seus subordinados. Deu a volta na praça principal, como de costume, e alojou-se e a seus soldados na casa abandonada de Vedoya. Em seguida, foi à casa dos Postlethwaite. As irmãs asseguraram que foram tratadas “com todo respeito e atenção não somente por Andresito, mas por todos os oficiais e homens que o acompanhavam”[26]. Segundo elas, “a entrada do exército indígena se deu com calma e boa ordem”. Contudo, por várias razões, a estadia de André e seu exército na cidade não continuou como lhes pareceu. Despertou, para além da imaginação, sentimentos de desprezo, terror, ira e pavor, além de atitudes que aludiam à vingança e justiça.
“Por ser yo quien soy”: autoridade, drama, bailes e bebedeiras
Depois da entrada do exército indígena em Corrientes, alguns habitantes da cidade começaram a experimentar os desdobramentos do que, até então, só existia em sua imaginação. Logo após a entrada triunfante, André e alguns dos seus seguidores conduziram presos os cabildantes de Corrientes que haviam prestado apoio a Vedoya. Levaram os políticos, entre eles clérigos, a bordo de um navio, como espécies de troféus de guerra. Inevitavelmente, os aliados do fugitivo Vedoya pensaram que seriam fuzilados. Porém, à medida que o navio se afastava do porto, o comandante indígena também se desesperou. André, que tinha “muito transtornada a cabeça, ocasionado, sem dúvida pela caminhada, comida fora da hora (…), muito excesso e entrevero de bebida e parte do balanço”[27], começou a gritar e dizer que queriam traí-lo, entregando-o aos seus inimigos paraguaios. De fato, banquetes não costumavam ser parte cotidiana da vida dos indígenas, mas se davam em situações específicas, ao sabor das conjunturas ou em rituais de bebedeira e comilança. O próprio André, segundo Pampín, declarou que não dava um centavo por um homem que não pudesse jejuar três ou quatro dias “sem inconvenientes”[28]. Cansado e sob os efeitos da comida e da bebida, depois da entrada cerimonial, distribuiu socos e golpes de sabre, até que, contido, desmaiou. Os indígenas o carregaram nos ombros e temeram que seu comandante tivesse sido envenenado, e, segundo Pampín, prometeram que se ele morresse, degolariam todos os moradores. André foi levado de volta à praça central em clima fúnebre. Alguns o tinham por morto. Quando finalmente “despertou do seu letargo o embriagado guarani, sentado em sua cama sepulcral e posto em pé, saudou ao seu irmão Lourenço com umas quantas cintadas”[29]. Depois, seguiu à sua nova morada e quartel militar, a casa de Vedoya.
É relevante destacar que renovadas abordagens sobre os regimes etílicos indígenas tem contribuído para romper com a ideia de que as bebidas alcoólicas sempre atuaram como uma espécie de trunfo exógeno para submeter populações nativas, vinculando aos indígenas a imagem de degradação, corrupção e deterioração causadas pelo consumo do álcool durante os contatos. O historiador João Azevedo Fernandes demonstra, por exemplo, que a noção sobre o ‘vazio etílico’ entre as sociedades indígenas é uma ficção que pode aparecer em diversos tipos de registros quinhentistas e seiscentistas, mas tanto europeus, quanto nativos conheciam as bebidas e fizeram usos muito distintos dela[30]. Alguns grupos indígenas as utilizavam em rituais, cujo objetivo era obter a ebriedade, ou seja, a embriaguez era um aspecto histórico e cultural que fazia parte dos ritos e celebrações no cotidiano das sociedades nativas. A antropóloga Nancy Oestreich Lurie é ainda mais contundente e questiona a noção de que o álcool alterou personalidades e provocou mudanças que atuaram em processos de ‘aculturação’ junto aos indígenas. Ela desafia o senso comum que assume que o uso da bebida entre indígenas foi e é sinônimo de crise identitária, usada como estratégia por eles para ocupar status e posições desejadas, que ordinariamente não ocupam; ou simplesmente, como uma válvula de escape que os transporta para um estado onde encontrem menos dificuldade de compreender a ‘assimilação’. Ela sugere que tais impressões não passam de desconhecimento sobre o fato de que a ingestão de álcool foi interpretada de diferentes maneiras em diferentes culturas[31]. Muitas vezes, indígenas utilizaram: “(…) o valor do estereótipo negativo como uma forma de comunicação e demonstração de protesto para registrar oposição e manter um limite contra o que eles não queriam até que pudessem alcançar o que queriam”[32].
Nos dias que se seguiram, em meio às bebedeiras, as armas foram recolhidas e a população parecia tomar certo cuidado em relação ao modo de tratar os indígenas. Todavia, “os correntinos, e particularmente as mulheres, não podiam vencer o habitual menosprezo com que olhavam os índios, e nada faziam para congraçar com Andresito, apesar de que se achavam todos à sua mercê”[33]. É bastante provável que boa parte dos moradores estivesse confusa, como Pampín, indignado ao confrontar-se com o fato de que André “se supunha com o bárbaro direito de poder arbitrar sobre as fortunas e vidas dos habitantes”[34]. Mesmo assim, os ânimos se acalmaram, quando através de um segundo ofício, André mandou reabrir o comércio e garantiu certa segurança para a cidade.
Não obstante, o comandante indígena continuava a praticar sua autoridade de maneira implacável. Exigia ser respeitado pelo cargo que ocupava e pelo poder que exercia. Parece ter havido pouca tolerância com posturas de desacato à sua posição política e militar. Em situações de conflito profundo relacionadas ao fato de ser indígena e ocupar uma posição política de grande destaque, André parece ter utilizado elaboradas estratégias para garantir o respeito às suas ordens, à sua figura pública e à história que partilhava com a sua gente. Em abril de 1816, mais de dois anos antes de sua entrada em Corrientes, manifestou desagrado e posicionou-se diante de uma situação de insubordinação do comandante da localidade de Mandisoví. Escreveu, em correspondência a José Artigas, sobre a falta de resposta aos seus despachos:
(…) tem sido para mim muito sensível, que o dito comandante me trate com menosprezo; não por ser eu quem sou, senão pelo cargo que ocupo, e que se eu lhe passei ofício, é porque lhe contemplo subalterno meu, e, portanto, deve estar sempre sujeito às minhas ordens, posto que V. S. estendeu minha faculdade até esta praça, e os naturais querem obedecer a esta comandância[35].
Vale observar que André não parece concordar com o fato de que ser indígena fosse motivo para ser tratado com menosprezo por alguém que ocupava uma posição política hierarquicamente inferior. Do mesmo modo, é interessante indicar que alguns indígenas pareciam estar mais atentos aos lugares políticos que de fato ocupavam, do que aqueles que utilizavam parâmetros ditos culturais para estabelecer rígidas diferenciações sociais. Entre os meios utilizados por André para lidar com situações que se repetiam, chama atenção o uso constante da violência física e psicológica na vivência de dramas que provocaram medo, raiva, riso e empatia.
Miguel Escobar e outros que buscaram o apoio de André quando Vedoya tomou o poder, voltaram à cidade e enviaram ao cabildo, do qual faziam parte, uma comunicação que solicitava recursos para pagar e recompor suas tropas. O cabildo acatou ao pedido. André o vetou e argumentou que lhe parecia ‘injusto e escandaloso’. Protestou que, apesar da nudez das tropas indígenas, “nunca havia caído em arbítrios tão violentos e sim havia se contentado com esmolas, expressão oficial, ou donativos voluntários”[36]. Exasperado, o comandante mandou novamente prender cabildantes que haviam sido partidários de Vedoya e outros que, como Ledesma e Olviedo, foram acusados de “assassinos de muitos guaranis e tapes e de uma revolução que premeditaram”[37]. Os presos foram tratados de maneira muito peculiar.
André os visitou à meia-noite. Ordenou que se dirigissem à praça principal, que havia sido cuidadosamente isolada, proibindo o trânsito de pessoas durante aquele “preparativo de terror”[38]. No trajeto entre a prisão e a praça, os detidos foram acorrentados a grilhões e fizeram o percurso descalços. Sofreram, segundo Pampín, “toda classe de ultrajes e insultos”, tendo os moradores como testemunhas. Caminharam escoltados por ruas irregulares, “cobertas de pedras, ossos e espinhos, sem que os guaranis se descuidassem de despojá-los durante sua marcha”[39]. Foram, em seguida, conduzidos a uma embarcação, aos cuidados de Campbell. André também intimou todos os demais foragidos da cidade para que comparecessem à sua presença dentro de quinze dias, especialmente os deputados que compunham o congresso de Corrientes. Pôs empenho em perseguir alguns políticos ‘fugidos’, como Vedoya, tarefa que também ficou a cargo de Campbell.
Os moradores estavam aturdidos e chorosos, especialmente as famílias dos presos, narrou Pampín. Andavam pelas ruas, batendo de porta em porta em busca de notícias sobre seus parentes. A cena dramática foi elevada “a um heroico grau” quando seis banquinhos foram colocados nos arredores da igreja. Acreditava-se que os presos cabildantes seriam decapitados. A impressão de Pampín era a de que André estudara ‘malignamente’ os efeitos da encenação e, ao provocar “um acesso de irritação, pondo os presos à beira do suplício”, faria com que as famílias respeitassem sua autoridade e clamassem por sua compaixão. Assim, a praça era constantemente reorganizada, “mas os malditos banquinhos não foram retirados”[40]. O preço da liberdade dos presos foi estipulado por André e Campbell em 10.000 pesos a serem pagos pelas famílias dentro de três dias. Ou pagavam a quantia e ficavam à espera do julgamento final de José Artigas, o Protetor do sistema da Liga dos Povos Livres, ou seriam confinados num povoado do Chaco, chamado São Jerônimo. A impossibilidade de conseguir a quantia fez com que as famílias apelassem ao comandante indígena com “prantos, súplicas e gemidos”, oferecendo suas casas, móveis e joias. Não obtiveram a clemência de André, nem trégua do assédio de Campbell para que cumprissem o estipulado, até que um padre, em companhia de outros religiosos, “felicitaram sua Senhoria Guarani (…) em idioma missioneiro” e suplicaram a soltura de cinco sacerdotes que estavam entre os presos. Os demais permaneceram a bordo do navio, ao que parece, prontos para zarpar rumo ao Chaco. Algumas famílias finalmente entregaram parte ou o total do dinheiro que diziam ter, mas não atingiram o teto de 10.000 pesos. Para inteirar a quantia, André permitiu que saíssem pelas ruas a pedir esmola, sob a vigília de Campbell:
Efetivamente, este brilhante plano se pôs em execução no dia 15 [de setembro] e seguiu até o dia 18, sem deixar confraria nem convento, nem cela, nem rancho pobre nem rico, grande nem pequeno, a quem não se pedisse esmola por redenção[41].
Conhecidas figuras políticas, oriundas de famílias abastadas, pedindo esmolas aos ricos e pobres indistintamente, a despeito de sua posição social e hierárquica, era, sem sombra de dúvidas, uma cena tão inusitada quanto os modos que André escolheu para desempenhar sua posição de mando. Os tempos revolucionários e a conjuntura em que se deu a ‘invasão’ de Corrientes contribuíram para que ele atuasse daquela maneira. Através da autoridade que lhe conferiram seu cargo político – governador de Misiones pelo sistema da Liga dos Povos Livres – e suas conquistas militares, agiu, exercendo poder e uma espécie de ‘liberdade’ que também foi entendida como vingança. Ações como estas davam a ver, aos olhos de alguns, que André ia “saciando nos presos seus vingativos rancores, colocava sua glória em insultar, castigando com suas mãos infames uns homens indefesos, (…) se apropriava de um poder ilimitado e uma liberdade sem freio”[42]. Aos olhos de outros, no entanto, “Andresito havia suportado até então muitas demonstrações públicas de menosprezo por parte da cidade, dando mais provas de indulgência do que se podia esperar (…)”[43]. Todavia – e a despeito do empenho de Pampín em acusar André de despotismo e da expressiva intenção das Postlethwaite em defendê-lo – as iniciativas indígenas não pareciam se reduzir exclusivamente a sentimentos de vingança ou como simples válvulas de escape para uma ira entendida como típica de setores sociais acostumados a vivenciar injustiças; tampouco, tais atitudes pareciam ter o único objetivo de provocar compaixão e gerar sentimentos de arrependimento e tolerância entre os correntinos. Os episódios traziam à tona um conjunto de experiências capazes de provocar algo mais complexo do que inversões de papéis sociais numa trama aparentemente carnavalesca[44], afinal, a ordem política e hierárquica parecia invertida aos olhos de quem?
Em sucessivas tentativas de estabelecer relações sociais pautadas tanto pelas diferenças hierárquicas, quanto pelas semelhanças culturais entre indígenas e correntinos, André promoveu festas nas quais atores indígenas encenavam peças teatrais baseadas em passagens bíblicas. Uma dessas “representações de caráter religioso ou dramas”, também chamados de ‘mistérios’, como explicam as Postlethwaite, era a tentação de Santo Inácio. As experiências de missionação que os indígenas Guarani da região viveram desde o século XVI, a partir do contato com os jesuítas, faziam deles conhecedores e praticantes da doutrina cristã. O drama ou a encenação da tentação de Santo Inácio, no entanto, revela aspectos complexos sobre a herança imaterial dos índios e auxilia na interpretação dos significados de suas ações. Nesse sentido, mais do que perpetuar uma prática que adveio da experiência junto aos missionários, as encenações parecem servir a outro propósito naqueles tempos de revolução: ‘doutrinar’, à moda indígena, os moradores correntinos. Afinal, por que a escolha do drama de Santo Inácio?
Inácio de Loyola foi um dos fundadores, senão o principal deles, da Companhia de Jesus em princípios do século XVI. Foi canonizado em 1622, menos de um século depois de ter dado início à ordem religiosa que, ao longo dos tempos, adquiriu inúmeros adeptos e importantes apoiadores, além de ter atuado enormemente na reforma da Igreja católica. Através das missões de evangelização e catequização junto aos indígenas no Novo Mundo, contribuiu em larga escala para a acumulação de capitais das Coroas espanhola e portuguesa. Antes de se dedicar aos estudos e à pregação da doutrina cristã, Inácio de Loyola participou de campanhas militares, foi preso, viveu de esmolas e fez rigorosas penitências. Através de situações de privação, sentiu-se ‘purificado’ e experimentou o que pode ser entendido, de acordo com sua autobiografia, como revelações e tentações, a partir das quais escreveu os famosos Exercícios Espirituaisde Santo Inácio[45]. Em suas ‘visões’, a Virgem Maria ganhou destaque em cenas militares e, através dos Exercícios, a ordem religiosa da Companhia de Jesus ganhou também novos seguidores, cavaleiros devotos e veneradores da santa. N. Senhora da Encarnação, um dos nomes da Virgem Maria, como nos lembram as Postlethwaite, era evocada durante o drama da tentação de Santo Inácio contracenado pelos soldados indígenas.
Assim, os Exercícios Espirituais de um dos mais importantes fundadores da Companhia jesuítica, adquiriram novos sentidos em meio aos dramas indígenas naqueles tempos de revolução, especialmente os seguintes, que introduzem ao seguimento de Jesus Cristo através do “chamamento do Rei temporal, [que] ajuda a contemplar a vida do Rei Eterno”:
92 – Primeiro ponto. Pôr diante de mim um rei humano, eleito pela mão de Deus nosso Senhor, a quem prestam reverência e obedecem todos os príncipes e todos os homens cristãos.
93 – Segundo [ponto]. Reparar como este rei fala a todos os seus, dizendo: Minha vontade é conquistar toda a terra de infiéis; portanto, quem quiser vir comigo, há-de contentar-se com comer como eu, e assim com beber e vestir, etc.; do mesmo modo há-de trabalhar comigo, durante o dia, e vigiar, durante a noite, etc., para que, assim, depois, tenha parte comigo na vitória, como a teve nos trabalhos.
94 – Terceiro [ponto]. Considerar o que devem responder os bons súbditos a rei tão liberal e tão humano; e, por conseguinte, se algum não aceitasse a petição de tal rei, quão digno seria de ser vituperado por todo o mundo e tido por perverso cavaleiro.
95 – A Segunda Parte deste exercício consiste em aplicar o exemplo precedente do rei temporal a Cristo nosso Senhor, conforme aos três pontos expostos. E quanto ao primeiro ponto, se consideramos tal apelo do rei temporal a seus súbditos, quanto é coisa mais digna de consideração ver a Cristo nosso Senhor, rei eterno, e diante dele todo o mundo universal, ao qual e a cada homem, em particular, chama e diz: Minha vontade é conquistar todo o mundo e todos os inimigos, e assim entrar na glória de meu Pai; portanto, quem quiser vir comigo, há de trabalhar comigo, para que seguindo-me na pena, me siga também na glória.
96 – Segundo [ponto]: Considerar que todos os que tiverem juízo e razão oferecerão todas as suas pessoas ao trabalho[46].
Somente depois de unidos pelos trabalhos diurnos e pelas vigílias noturnas, os fiéis e infiéis poderiam tomar parte na conquista do vencedor, “um rei humano, eleito pela mão de Deus nosso Senhor, a quem prestam reverência e obedecem todos os príncipes e todos os homens cristãos”, seguindo-o e com ele compartilhando situações de penúria e glória[47]. Aquele que não tivesse tal juízo e não formasse tal razão mereceria “ser vituperado por todo o mundo e tido por perverso cavaleiro”. Durante a encenação, os atores dançavam e, assim, em meio à performance, demonstravam devoção à santa compondo, através de letras, palavras como Encarnación. As Postlethwaite contaram que André pediu a elas que o ajudassem na confecção de figurinos para as peças teatrais ou “bailes de índios”, como os correntinos referiram[48]. Elas fizeram “vestidos de fantasia, os mais vistosos que foi possível fazer, e uma vez terminados, vieram em casa os atores para estreá-los”[49]. Os figurinos foram feitos para os soldados que representaram os anjos guardiões de Santo Inácio no drama. Elas fizeram “dois ou três” trajes, a princípio, e depois, mais dois; ao que tudo indica, o mesmo número de anjos que acompanhavam Santo Inácio na obra de arte de Peter Paul Rubens, criada no primeiro quartel do século XVII.
Figura 8 -Ruben, Peter Paul (1577-1640). Miracle of St. Ignatius (1617-1618). Óleo sobre tela, 535 x 395 cm. Kunsthistorisches Musuem – Viena[50].
Fonte:https://commons.wikimedia.org/wiki/Peter_Paul_Rubens/Saints. Acessado dia 17/03/2017.
Quando vestiram os trajes, os soldados se mostraram extremamente contentes e admiraram a beleza das roupas fitando-se uns aos outros. As asas angelicais não combinavam muito bem com os capacetes que eles usavam, sob o ponto de vista das irmãs, mas não quiseram se despir deles. E assim, os atores seguiram participando de cenas dramáticas, desempenhando papéis importantes e caracterizados com aparatos e elementos misturados; e que, analisados com mais detalhe, podem revelar aspectos interessantes sobre a cultura política dos indígenas e sobre processos de reelaborações culturais vividos coletivamente. Trata-se, certamente, de uma caracterização rica e articulada, na qual:
(…) a incoerência entre as normas, a ambiguidade das linguagens, a incompreensão entre grupos sociais ou simples indivíduos, a ampla inércia ditada pela preferência por um estado habitual ou pelos custos que derivam de escolhas feitas em condições de extrema incerteza não são obstáculos que nos impeçam de considerar esta sociedade como sendo ativa e consciente em cada uma de suas partes, nem de vermos seu sistema social como o resultado da interação entre comportamentos e decisões assumidos no âmbito de uma racionalidade plena e limitada[51].
Contudo, considero que, mais interessante do que indicar situações mediadas por escolhas conscientes de uma sociedade cuja dinâmica se mostra extremamente ativa, é pontuar que todo aquele cenário preparado pelos indígenas contém “significado decididamente político”, como Carlo Ginzburg constatou ao interpretar um “enigma iconográfico”, no qual um “jogo cruzado e divergente de olhares” pôde excluir certas personagens e expectadores[52]. Ao analisar diversas imagens que compuseram a criação de uma obra de arte – que é também um registro histórico – em torno da qual vários ‘mistérios’ ainda permanecem, Ginzburg considera que através da investigação histórica é possível lograr avanços interpretativos. Ele demonstra como interesses distintos e escolhas políticas também fizeram parte de elementos utilizados na representação de cenas que, a princípio, pareciam ser de caráter exclusivamente religioso.
Assim também, o fato de serem soldados indígenas integrantes da tropa de uma reconhecida e temida autoridade política e militar viabilizou a preparação de bailes e peças teatrais de caráter religioso. Mesmo assim, seus esmeros em promover as festividades nem sempre receberam a atenção e audiência esperadas. A encenação do drama de Santo Inácio, por exemplo, contou com o comparecimento de poucos expectadores. Se “os infiéis” não podiam partilhar dos festejos que ocorriam para celebrar a glória da conquista de Corrientes pelo exército indígena, era porque não viveram as situações de penúria que os soldados experimentaram até aquele momento. Se este foi o pensamento de André, não podemos afirmar. O fato é que, como boa parte dos correntinos não compareceu àquela teatralização, na manhã seguinte, ao som dos tambores do exército e sob a força das armas, “todas as pessoas respeitáveis (…) foram reunidas na praça e obrigadas a capinar até deixá-la limpa de um extremo a outro”[53]. Durante todo aquele dia quente do mês de outubro de 1818, os presos convocados trabalharam sob um sol escaldante, “sem permitir-lhes, tampouco, o mais leve alimento nem descanso”[54]. Para conseguir beber água, suplicaram aos soldados e lhes ofereceram gratificações. Mas, segundo Pampín, a ordem que receberam de André era de serem inflexíveis e empenhados em usar “todo o rigor da chibata e do sabre, particularmente nos mais decentes e bem vestidos”[55]. A situação remetia a um estado de humilhação excepcional, pois “não obstante a compaixão que provocavam os trabalhadores forçados, a ocorrência do índio inspirava riso também”[56].
Quando o sol se pôs e o cenário foi visto como não havia estado até então, com a praça terraplanada, capinada e livre de ‘imundícies’, com várias carretas de pedras retiradas, André convocou outro baile. Os trabalhadores forçados foram dispensados de comparecer, não sem antes serem obrigados a dar vivas “à Pátria e ao índio”[57]. Afogado em aguardente, segundo Pampín, André aplicou outra “rasteira política” aos correntinos ilustres: “ordenou a seus índios e negros da escolta que saíssem e levassem mulheres brancas para que dançassem com eles e com os oficiais, com prevenção que estes estavam como seu chefe”[58], sob efeito do álcool. Os bailes se tornaram frequentes, e diante de uma liberdade tão desenfreada, como consta no testemunho do comerciante espanhol, as “mulheres honradas” não se sentiam seguras. Além disso, as irmãs inglesas afirmaram que esta ‘afronta’ foi “muito mais imperdoável do que o labor manual imposto às pessoas do sexo masculino”[59].
Ocorreu que os presos, após uma noite de descanso e vigília, foram intimados a continuarem os trabalhos na praça durante o dia, enquanto suas esposas e filhas, contaram as Postlethwaite, eram obrigadas a dançar com os índios e negros. Embora a maioria do exército de André fosse indígena, também era composto por um destacamento de granadeiros negros, entre os quais, alguns foram libertados pelo comandante em seu caminho rumo a Corrientes, e depois, durante sua estadia na capital. De acordo com Pampín, alguns escravizados “se achavam na maior petulância, altivez e soberba” e delatavam seus senhores, “porque seus vícios se viam apadrinhados e protegidos pelo chefe guarani”[60]. É importante ressaltar que os indígenas e escravizados nem sempre eram protegidos pelo comandante, que lhes impôs, em repetidas ocasiões, castigos físicos e outras punições severas. A disciplina militar fazia parte do aprendizado de André no exercício de seu cargo e era um dos meios pelos quais exercia sua autoridade. E parece ter sido assim que, durante o governo de André, Corrientes viveu momentos em que:
(…) faziam-se eternas as noites, ainda que partiam as horas do sono e a vigília que o medo impunha (…). No dia, não obstante que a luz alegrava, se desejava a ausência do sol, já para refugiar-se num convento, em busca de asilo, já para recolher-se, cada qual no último rincão e esconderijo de sua casa, para livrar-se da vista dos tigres que espreitavam até as palavras, passos e movimentos, e acreditando talvez, que se teria um dia a menos de tão cansado gênero de vida[61].
As palavras de Pampín sugerem que, caso tenham feito parte do escopo cultural utilizado por André nos preparativos dos dramas e em suas inserções políticas, os Exercícios Espirituais de Santo Inácio surtiram algum efeito entre os correntinos abastados. Mas, como partilhar dos significados que as trajetórias daqueles soldados imprimiam à conquista de Corrientes sem experimentar ser indígena? As Postlethwaite, por exemplo, mesmo tomadas por sentimentos de empatia e prestando apoio à política do comandante, se divertiam “ao ouvir aos indígenas se dirigirem sempre a nós chamando-nos paisanitas ou índias louras”, mas não pareciam discordar das observações que, segundo elas, os soldados fizeram, pontuando que Campbell também era indígena.
De todo modo, os Exercícios Espirituais não foram os únicos dramas sentidos ‘na carne’ pelos correntinos. Quando André adentrou à cidade, com seu numeroso e equipado exército, cerca de duzentos meninos indígenas integravam as tropas, armados como os demais corpos de infantaria e cavalaria, com fuzis, lanças, arcos e flechas, como mencionamos no início do capítulo. Segundo as ‘paisanitas’ inglesas, “estes indiozinhos haviam sido apresados por correntinos e tidos como escravos. André ia libertando-os onde os encontrava, apoderando-se ao mesmo tempo de um número igual de filhos daqueles homens a cujo serviço estiveram os índios”[62]. Os pais dos meninos brancos, afirmaram, viviam em agonia e angústia sem saber a sorte que seus filhos podiam esperar. Ao aludir aos dias de trabalho e noites de vigília intermináveis vividas pelos correntinos, Pampín também se referiu “aos pais e mães [que] esperavam por momentos em que fossem arrebatados de seus braços os ternos filhos de suas entranhas, com o bárbaro objetivo de criar um corpo de jovens, que (…) seguissem as marchas dos tiranos”[63].
Situações semelhantes à descrição do desespero de pais e mães correntinas certamente repetiram-se muitas vezes com os pais indígenas de quem filhos e filhas foram apartados para servir como recrutas ou serviçais, como vimos em alguns exemplos dos capítulos anteriores. Portanto, não foi sem motivo concreto que, depois de manter os meninos brancos sob seu poder por cerca de uma semana, André solicitou o comparecimento de suas mães. De acordo com os Recuerdos das irmãs,
(…) repreendeu-as duramente a crueldade e injustiça de que se fizeram culpadas ante os pobres índios e apelou ao mesmo sentimento de angústia em que agora se encontravam como a melhor prova do cargo que lhes fazia. ‘Podem levar seus filhos agora – concluiu – mas lembrem-se adiante que as mães índias também têm coração’.
Apesar das atitudes perspicazes e das palavras comoventes de André, colocar-se na pele do outro era algo muito complicado, sobretudo quando os atos promovidos para aproximar pessoas com experiências distintas geravam tantos atritos e controvérsias e suscitavam tantas memórias sobre violência, injustiça e perdas inestimáveis. Entre agosto de 1818 e março de 1819, meses em que a presença de André e seu exército se fez sentir de maneira mais intensa em Corrientes, os espaços de negociação e de readaptações foram conturbados, como nos deixam ver os relatos de Pampín e das Postlethwaite. Méndez foi reposto no cargo de governador de Corrientes num “andresíssimo cerimonial”, no dia 22 de setembro de 1818, depois do qual o comandante indígena permaneceu na cidade por mais algum tempo, a fim de garantir segurança ao retorno do governador. “Sua Senhoria Guarani”, como a ele se referia Pampín, continuou a promover bailes e participar de bebedeiras, durante às quais punha em prática sua autoridade, quase sempre de maneira violenta, tanto com seus afetos, como com os desafetos. Melchora Caburú, “uma china branca e loura de olhos azuis e de trato modesto e afável” era tida como a preferida de André. Pelo visto, era uma das presenças mais aguardadas nos bailes, tanto por ele, quanto pelas mulheres ‘honradas’ e “boas correntinas” que faziam par com índios e negros nas danças, pois era ela quem aplacava “os excessos desenfreados do tal luxurioso e bárbaro índio”[64]. Pouco tempo depois, José Artigas solicitou que o comandante indígena retornasse a Misiones, já que novos confrontos com os portugueses eram esperados. Quando André deixou Corrientes, soldados vestidos com as roupas de anjos confeccionadas para a encenação do drama de Santo Inácio o escoltaram até que, já distantes da cidade, tiraram os trajes. André retornou uma vez mais, quando soube que Melchora frequentara bailes na sua ausência. Segundo o comerciante espanhol, diante disso “Sua Senhoria guarani-tape, abandonou Melchora com a mesma facilidade com que a havia abraçado para companheira (…)”, não sem antes castigá-la com “golpes de sabre e as mais grosseiras imputações”[65].
Diversos episódios que pareciam às vezes inverter e às vezes reificar a ordem política e os lugares sociais tipicamente ocupados por abastados e marginalizados podiam afastar e aproximar os setores que disputavam poder, à medida que alteravam as escalas de mobilidade social que advêm com o exercício dele. Ou seja, os espaços intermediários de negociação minguavam quando parte dos atores envolvidos lutava para consolidar seus novos papéis na cena política, enquanto outra parte buscava permanecer em seus antigos e privilegiados lugares sociais. Naquele cenário, a inversão tão pungente sobre os significados de ser índio e as maneiras de exercer o poder foram praticadas, a ponto de balançar concepções sobre referências sociais e culturais e acirrar as disputas por posições políticas.
As revoluções platinas não tiveram como resultado apenas os conflitos dividindo grupos étnicos e sociais que buscavam exercer autonomia política. Dividiram, além dos espaços de negociação, as terras, os bens e as gentes indígenas. Além disso, os esforços e os legados das iniciativas nativas na época das revoluções deixaram marcas profundas na divisão dos espaços e na história social da formação daqueles lugares, como mostram os registros sobre as atuações de André e José Artigas:
Na carreira da revolução e quando D. José Artigas conseguiu evadir-se e sacudir o jugo de Buenos Aires, intitulando-se independente daquele governo, como Supremo Chefe dos Orientais e seguidamente como Protetor da Federação dos Povos de Entre-Rios e Santa Fé, elevou seu amado filho D. André à investidura de comandante general da Província de Misiones e tropas dela. É bem sabido, por tal pública, a baixa e escandalosa conduta do general D. José Artigas e, portanto, se deixa conhecer a moralidade que ao lado e na escola daquele patriarca, a anarquia que se imprimia na alma de D. André e que elevado este ao posto de chefe das Misiones, se fariam familiares o assassinato, o roubo com descaramento, a tirania e o despotismo, a desdenhosa e soberba altivez, a embriaguez consumada, a vida dissoluta e escandalosa e enfim, eram tais e tantos os desaforados vícios da negra e vil alma do índio Andresito, que para dar-lhe a conhecer, seria faltar com a verdade, sem o apoio da própria experiência. Pode-se dizer sem exagero que submissão mais absoluta que lhe tributou em Corrientes, jamais se deu a homem algum, nem jamais homem algum, a mereceu menos que o indecente índio Andresito Artigas.
Embora os limites forjados a partir de intensas disputas políticas tenham sido estabelecidos, eles permanecem porosos e a presença da história indígena jamais se evadiu daqueles cenários. A despeito da quantidade de adjetivos pejorativos, da escolha tendenciosa de tipos de ações e comportamentos que Pampín utilizou para descrever ‘a negra e vil alma do índio Andresito’ – e para conformar um modelo estereotipado da agência indígena nos rumos das políticas, durante as revoluções que ameaçavam a continuidade de rígidas regras hierárquicas e a manutenção de lugares de privilégio, apoiados em diferenciações culturais – algumas de suas impressões parecem fazer sentido, se interligarmos análises e exemplos anteriores sobre o leque de pressões e oportunidades que os indígenas enfrentaram durante as duas décadas iniciais do XIX: eles, os adjetivos, não são suficientes para dar a conhecer a alma de André, sem o apoio da experiência. Quer dizer, sem entender o que os indígenas fizeram, não é possivel entender quem são.
Nesse sentido, como afirmou Frederik Cooper em seus provocativos apontamentos sobre o uso de conceitos e ferramentas utilizadas na análise de transformações e permanências conjunturais e estruturais, “a maneira como se faz história modela como se pensa sobre política, e a maneira como se faz política afeta como se pensa sobre história”[66]. Diante de tal envolvimento entre a prática de uma e outra, ele alerta que essas histórias não podem ser analisadas como um conto do progresso em direção à ‘modernidade’ ou como o avanço da globalização em contraponto à afirmação de identidades que lutam contra forças opressoras; não podem ser contadas como uma história do avanço dos Estados nacionais sobre os impérios coloniais, porque além de simplificar os processos, pondero, não levam em conta as múltiplas motivações e maneiras de fazer política de atores que desempenharam papéis cruciais e contribuíram para modificar sociedades e sistemas em contextos de transição.
À guisa de conclusão
Os modos de vivenciar os significados de ser índio naqueles tempos informam sobre histórias complexas, das quais os indígenas fizeram parte, e ultrapassam fronteiras políticas e culturais. Afinal, como vimos, situações diversas provocaram ira, afeto, desprezo, temor, solidariedade e violência entre correntinos, indígenas e escravizados. Em nenhuma passagem dos relatos, entretanto, a identidade indígena de André deixou de ser a ele atribuída. Em um de seus escritos se reconheceu como tal e demonstrou que também tinha perspectivas sobre como deveria ser a recepção das atribuições que eram inerentes ao seu cargo político. Era sensível para ele, como escreveu, que um subordinado não atendesse às ordens de seu superior, não pelo fato de “ser eu quem sou”, mas por ocupar um lugar político mais destacado. Mas quem era André? Quem ele pensava ser? Quem os correntinos – e todos que com ele se relacionaram – pensavam que ele fosse? Não há dúvida em afirmar que as respostas para estas perguntas podiam variar bastante. Mas vale a pena perceber que, talvez, justamente por “ser ele quem era” tenha contrariado, atendido e superado diferentes expectativas sobre como ele deveria agir. Suas ações e as de seu exército demonstram maneiras diferentes, criativas e autônomas de exercer autoridade, de praticar dietas – sobretudo em relação ao regime etílico –, e de ‘pregar’ a conversão política. Sem dúvida, a estadia de André e seu exército em Corrientes evidencia que os indígenas podiam ocupar, como de fato ocuparam, outras posições sociais. Aliás, pode ser que só as tenham ocupado pelo fato de serem quem eram, indígenas.
Os episódios que marcaram a invasão de Corrientes por um exército indígena e mestiço, nos permitem refletir sobre os profundos significados e implicações de ser indígena no auge de um contexto revolucionário. Os registros indicam que indígenas estiveram atentos aos lugares políticos que de fato ocupavam, e assim como nos capítulos anteriores, viveram dramas, experimentaram os efeitos de rígidas diferenciações políticas e sociais, provocaram sentimentos confusos como raiva, medo, riso e empatia. Praticaram e sofreram os usos da violência física e psicológica ao desempenharem seus papéis de poder.
Diante dessas colocações é interessante perceber como as histórias indígenas se conectam à história de formação dos Estados nacionais na região platina, por exemplo, através da maneira como o último capítulo retorna ao primeiro. Num movimento que alterna e renova antigos e novos cenários de luta pela terra e por recursos animais e naturais, podemos ver na trajetória ímpar de André o reflexo das repetidas experiências de milhares de indígenas envolvidos nos enredos dos capítulos anteriores. Isto é, os dramas vividos por eles são intensos, as situações de conflito são extremas: há recrutamentos forçados, famílias divididas, parentes mortos, filhos escravizados e apartados de seus pais, moradias e bens roubados, terras usurpadas; tudo documentado e registrado em distintos tipos de cartas, projetos, planos, acordos, tratados, instruções, diários, regulamentos e leis.
Não obstante, suas mobilizações políticas modificaram os rumos e os contornos das revoluções, demonstrando habilidosas capacidades, não apenas de ‘agir conscientemente’, mas de exercer poder, mesmo em situações precárias, onde suas posições sociais foram continuamente deslocadas, onde a valorização de seus serviços, às vezes, caminhou de mãos dadas com a marginalização dos seus lugares na história. No processo de formação e construção das fronteiras os indígenas atuaram e, em conjunto, suas atividades contribuíram para alargar e variar os parâmetros culturais e sociais formadores de identidades étnicas, sociais, regionais e transnacionais. A diversidades de suas ações também contribuíram para conformar a (des)organização do espaço platino.
Fontes iconográficas
Miracle of St. Ignatius (1617-1618). Óleo sobre tela, 535 x 395 cm. Kunsthistorisches Musuem – Viena.
Disponível em https://commons.wikimedia.org/wiki/Peter_Paul_Rubens/Saints. Acessado dia 07/03/2017.
Fontes impressas
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POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, J. P. e G. P. Cartas de Sud-América. v. III. Buenos Aires: Emecé Editores, 1950.
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LOYOLA, I. Exercícios Espirituais [3ª Ed.]. (Trad.) Pereira, Vital Cordeiro Dias; (Org.) Baptista, F. de Sales. Braga: Livraria A.I., 1999.
Bibliografia utilizada
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CARVALHO, Jr. Almir Diniz de. Índios cristãos: a conversão dos gentios na Amazônia portuguesa (1653-1769). Campinas, SP, 2005 (Tese de doutorado).
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GINZBURG, C. Indagações sobre Piero: o Batismo, o Ciclo de Arezzo, a Flagelação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.
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LURIE, N. O. The World’s Oldest On-Going Protest Demonstration: North American Indian Drinking Patterns. Pacific Historical Review. University of Carolina Press, v. 40, n. 3, Aug. 1971.
MACHÓN, J. F.; CANTERO, O. D. Andrés Guacurary y Artigas. Misiones [1ª edição]: o autor, 2006.
WILDE, G. Religión y Poder en las misiones de guaraníes. Buenos Aires: Editorial SB, 2009.
Notas
[1] MACHÓN, J. F.; CANTERO, O. D. Andrés Guacurary y Artigas. Misiones [1ª edição]: o autor, 2006, p. 26 e 29. Estes autores pontuam a incerteza sobre Andrés ser natural de São Borja ou Santo Tomé. Já Cabral (2012), afirma que Andrés nasceu em São Borja, no dia 30 de novembro de 1778. CABRAL, Salvador. Andresito Artigas en la emancipación americana. Buenos Aires: Corregidor, 2012.
[2] MACHÓN; CANTERO, op. cit., p. 182-183.
[3] O território de Misiones contava com trinta povos missioneiros. Sete deles situados à margem oriental do rio Uruguai e o restante à margem ocidental. Após a conquista de 1801, os sete povos da margem oriental passaram a integrar os domínios portugueses na capitania do Rio Grande de São Pedro.
[4]PAMPÍN, F. F. Memorias sobre la degradante humillación que Corrientes y su Provincia sufrió del ejército de Guaranís y Tapes, al mando de su general Dn. Andrés Artigas, con una idea de las principales causantes de tantos como irreconciliables males que sufrió desde aquella desgraciada época, hasta el memorable dia 12 de octubre del año 1821, por un vecino y decidido, por la felicidad de la Provincia correntina” apud MANTILLA, D. Memorias Fermín Félix Pampin. Corrientes: Moglia, 2004, p. 88. Os Extractos foram elaborados pelas duas irmãs e escrito pela mais nova delas.
[5] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, J. P. e G. P. Cartas de Sud-América. v. III. Buenos Aires: Emecé Editores, 1950, p. 105.
[6] PAMPÍN apud MANTILLA, op. cit., p. 51.
[7] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 63.
[8] Ibid., p. 65
[9] Idem.
[10] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 68.
[11] Ibid., p. 68.
[12] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, 1950,p. 106.
[13] Ibid., p. 106.
[14] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 69.
[15] Ibid., p. 77.
[16] Ibid., p. 74.
[17] Ibid., p. 83.
[18] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 83.
[19] Ibid., p. 85. O grifo é da fonte.
[20] De acordo com os historiadores Jorge Francisco Machón e Oscar Daniel Cantero, Pedro Campbell era irlandês. No relato das Postlethwaite e de Pampín, sua origem é referida como inglesa. In: MACHÓN; CANTERO, 2006, p. 153.
[21] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 85-86. Ver: nota 31.
[22] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, 1950,p. 107.
[23] PAMPÍN apud MANTILLA, op. cit., p. 87.
[24] Ibid., p. 87.
[25] Ibid., p. 88; POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, op. cit., p. 108.
[26] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, op. cit., p. 109.
[27] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 89.
[28] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, 1950, p. 113.
[29] Ibid., p. 113.
[30]FERNANDES, J. A. Selvagens bebedeiras: Álcool, Embriaguez e Contatos Culturais no Brasil Colonial (séculos XVI-XVII). São Paulo: Alameda, 2011, p. 205.
[31]LURIE, N. O. The World’s Oldest On-Going Protest Demonstration: North American Indian Drinking Patterns. Pacific Historical Review. University of Carolina Press, v. 40, n. 3, Aug. 1971. p. 312.
[32] Ibid., p. 314-315.
[33] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, 1950, p. 110.
[34] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 90.
[35] CABRAL, 2012, p. 223-224.
[36] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 92.
[37] Ibid., p. 93.
[38] Idem.
[39] Idem.
[40] Ibid., p. 95.
[41] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 98.
[42] Ibid., p. 99.
[43] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, 1950, p. 111.
[44] WILDE, G. Religión y Poder en las misiones de guaraníes. Buenos Aires: Editorial SB, 2009, p. 343.
[45]LOYOLA, I. Autobiografia de Santo Inácio de Loyola. (Trad.) Coelho, Antonio José. Braga: Editorial A.O., 2005; LOYOLA, I. Exercícios Espirituais [3ª Ed.]. (Trad.) Pereira, Vital Cordeiro Dias; (Org.) Baptista, F. de Sales. Braga: Livraria A.I., 1999.
[46] LOYOLA, 1999, p. 24. Grifos meus.
[47] Para relacionar outros interessantes aspectos da conversão espiritual entre grupos indígenas ao norte do que hoje é o Brasil ver CARVALHO, Jr. Almir Diniz de. Índios cristãos: a conversão dos gentios na Amazônia portuguesa (1653-1769). Campinas, SP, 2005 (Tese de doutorado).
[48] POSTLETHWAITE, op. cit, p. 111-112.
[49] POSTLETHWAITE, op. cit, p. 112.
[50] De acordo com Margarida de Souza Neves, o quadro de Rubens foi pintado para presidir o altar da Igreja dos Jesuítas em Antuérpia, e só em 1776, é que foi transportado para Viena. Seguindo com a análise da historiadora, ao centro da cena está Inácio de Loyola, celebrante da missa, ao lado e na frente de um grupo de jesuítas. Tendo a cabeça envolta numa espécie de auréola, ele abençoa os fiéis, entre eles um homem e uma mulher doentes, em crise epilética, posicionados no lado esquerdo da tela. “A composição do quadro, os recursos técnicos de Rubens e a retórica barroca da tela, aumentam a dramaticidade da tela, na qual não falta a representação da doença como possessão demoníaca, uma vez que uma dupla imagem do demônio aparece na parte superior do quadro, como se a benção do fundador da Companhia de Jesus houvesse operado o milagre da cura dos dois epiléticos. É interessante observar que o demônio aparece pintado em duas versões: como o Leviatã forte e poderoso e como o dragão negro e alado do imaginário medieval”. Chamam a atenção também, as duas mulheres com crianças de colo, que observam os milagres. Observamos que Inácio de Loyola ocupa o lugar principal da cena, mas está num espaço que intermedia os planos à frente e ao fundo, onde estão os fiéis e infiéis, os anjos guardiões e os demônios. In.: NEVES, M. S. Disponível em http://www.historiaecultura.pro.br. Acessado em 15/03/2017.
[51]LEVI, G. A herança imaterial: trajetória de um exorcista no Piemonte do século XVII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000, p. 46.
[52]GINZBURG, C. Indagações sobre Piero: o Batismo, o Ciclo de Arezzo, a Flagelação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989, p. 93, 94 e 102.
[53] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, 1950, p. 111.
[54] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 105.
[55] Ibid., 2004, p. 105.
[56] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, op. cit., p. 111. O grifo é meu.
[57] PAMPÍN apud MANTILLA, op. cit., p. 105.
[58] Ibid., p. 97 e 105.
[59] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, 1950, p. 111.
[60] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 108.
[61] Ibid., p. 108.
[62] POSTLETHWAITE apud ROBERTSON, 1950, p. 108.
[63] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 108.
[64] PAMPÍN apud MANTILLA, 2004, p. 106-107.
[65] Ibid., p. 125 e 120.
[66] COOPER, F. Colonialism in question: theory, knowledge, history. Berkeley and Los Angeles: University of California Press, 2005, p. 231.
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